Uma noite feliz no 'castelo' do 'Rei' entre rosas, cotoveladas, emoções e aquelas irresistíveis canções de Roberto Carlos
♬ Uma frase atribuída a Caetano Veloso com a tese de que o cancioneiro de Roberto Carlos personifica o inconsciente coletivo do povo brasileiro me veio à mente diversas enquanto assistia ao segundo dos dois shows feitos por Roberto na Brava Arena Jockey, no Rio de Janeiro (RJ), na noite de ontem, 17 de dezembro.
Já fazia mais de três anos que eu não via Roberto Carlos ao vivo. O último show que presenciei tinha acontecido em 9 de julho de 2022 na casa Qualistage, também no Rio de Janeiro (RJ).
Como esperado, nada mudou substancialmente. A turnê agora se chama Eu ofereço flores, nome da canção que Roberto lançou em 23 de novembro de 2023 para expressar a gratidão pelo público que o mantém no trono de rei da canção popular romântica. Eu ofereço flores é a canção que passou a encerrar o show, após o spiritual Jesus Cristo (1971), sendo a trilha perfeita para a distribuição das rosas pelo cantor enquanto a banda, regida pelo maestro Eduardo Lages, repete numerosas vezes a parte instrumental que alicerça o refrão.
A propósito, impressiona a luta (às vezes até física) do público para ganhar uma das rosas arremessadas pelo cantor do palco. Nessa hora, vale cotovelada, vale empurrão. Tanto que o próprio Roberto Carlos, já ciente da passionalidade dos súditos, adverte o público no início do show para que ninguém se machuque na hora das rosas.
Entre tapas e rosas, todo mundo saiu feliz da Brava Arena Jockey, falando mais das rosas do que do show que certamente já viram outras vezes. Sim, o show de Roberto Carlos é essencialmente o mesmo há décadas. E essa certeza da manutenção das tradições (também) ajuda a explicar a força com que o artista se mantém na preferência de um público majoritariamente feminino e já idoso como o cantor de 84 anos.
Para que mexer em um time vitorioso, invicto há mais de 60 anos? O jogo de cena do cantor com o público é especial. Como latin lover, Roberto faz crer que cada espectadora é a musa amada das canções que vão se perpetuando através de gerações.
Conversando recentemente com Lenine, ele me chamou atenção para o fato de que Roberto Carlos já entrega e diz tudo no primeiro verso de cada música. Percebi ontem que a percepção de Lenine é apurada. Roberto já ganha o jogo quando canta o primeiro verso de cada música.
Particularmente, o que mais me seduz no show do cantor é a longa passagem instrumental de tom roqueiro, meio prog, do arranjo de Cavalgada (1977), uma das numerosas obras-primas de Roberto com Erasmo Carlos (1941 – 2022). Tanto que acordei hoje com vontade de ouvir, e ouvi, acionando diversas vezes a tecla repeat, esse arranjo no álbum ao vivo Roberto Carlos em Las Vegas (2015), lançado há dez anos.
Enfim, foi uma noite feliz entre rosas, cotoveladas, emoções, empurrões (dos quais escapei por não ter entrado na disputa pelas rosas) e, sobretudo, entre aquelas canções do Roberto de que Caetano Veloso já mencionava embevecido, em 1968, em verso da letra da música Baby. E quantas canções de 1968 para cá! Que obra!
Sob esse prima, lamento que o roteiro dos shows de Roberto Carlos tenha pouca flexibilidade. Quantas músicas Roberto poderia tirar do baú! Lembro de imediato de Se eu partir (canção linda de Fred Jorge do emblemático álbum de 1971), À distância (1972), Palavras (1973), Você (1974), Você em minha vida (1976), Não se esqueça de mim (1977), Mais uma vez (pérola esquecida da dupla Maurício Duboc e Carlos Colla, do álbum de 1979) e Costumes (1979), para ficar somente na discografia dos anos 1970.
Mas que plebeu sou eu para dar palpites no roteiro dos shows do Rei? Roberto Carlos é o que é por ignorar pitacos alheios e ser há 60 anos Roberto Carlos, o inconsciente coletivo desse povo brasileiro tão sentimental e no fundo tão conservador quanto o cantor que idolatra.
Fonte Original: G1
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